Douglas Adams: a revolução veio em forma de piada


No dia 25 de maio, é comemorado o Dia da Toalha. Nesta data, nerds do mundo inteiro celebram a nerdice e homenageiam Douglas Adams, autor de O Guia do Mochileiro das Galáxias.
A obra máxima de Adams surgiu em 1978 como um áudio drama transmitido pela rádio BBC Radio 4. Um ano depois, a aventura de Arthur DentFord PrefectMarvin e cia. se transformaria no primeiro volume de uma série de livros, que é popularmente chamada de “uma trilogia em cinco partes”.
O Guia do Mochileiro das Galáxias logo se tornou uma obra importante para a cultura pop, por revolucionar o que era conhecido até então em termos de ficção científica – até a década de 70, o sci-fi era um gênero predominantemente dramático, e Adams foi na contramão de tudo isso, apresentando uma obra puramente cômica, com momentos que beiram o absurdo. A ideia do autor não foi bem recebida num primeiro momento pelos produtores da BBC Radio 4, que torceram o nariz para o conceito. Em uma entrevista dada em 1994, ele conta como foi difícil convencer a emissora a produzir o áudio drama:
Quando eu cheguei com a ideia para um produtor de comédia, ele disse “bem, essa ideia tem robôs e naves, certo? Bem, isso é drama. Você precisa ir falar com o departamento de dramaturgia. E eu fui para o departamento de dramaturgia e eles disseram “sim, robôs e naves, nós fazemos isso. Mas espera aí, o que é isso? Uma piada? Desculpa, não produzimos piadas. Você precisa falar com o departamento de comédia.
Após muita argumentação, Adams conseguiu convencer a rádio a produzir o áudio-drama de O Guia do Mochileiro das Galáxias. Não deu outra: foi um sucesso de público e de crítica, elogiado principalmente por suas “piadas de cunho semântico e filosófico, pela prosa ágil e pelo revolucionário uso de efeitos sonoros e técnicas de voz”. Ouça o primeiro 
Apesar das reclamações de alguns fãs hardcore de ficção científica (e nem existia internet!), no geral, os nerds se apaixonaram pelo Guia. Naquela época, as piadas dirigidas à essa comunidade tinham como alvo as próprias paixões geeks, que eram vistas com um certo desdém, mas Adams chegou subvertendo as convenções do gênero com suas piadas certeiras, criando toda uma forma de se fazer humor com as histórias de naves, robôs e lasers. Douglas Adams não estava rindo deles — estava rindo com eles.
Além das sátiras com os elementos básicos da ficção científica, Adams também foi bastante elogiado pelo seu humor absurdo: o escritor foi o primeiro roteirista que não integrava o sexteto criador do Monty Python a escrever um esquete para a série Monty Python’s Flying Circus. Com a trupe, o autor desenvolveu sua propensão para o nonsense – algo que, em O Guia do Mochileiro das Galáxias, renderia momentos hilários como a cena da baleia que, do nada, surge a muitos metros da superfície de um planeta e que, durante a queda, questiona qual é o propósito de sua vida. Faz sentido? Não. Mas é muito engraçado!
Não bastasse tudo isso, Adams também usava do humor para criticar (duramente) os costumes da sociedade britânica da época, principalmente a extensa burocracia presente em quase todos os departamentos do governo do Reino Unido. Ele aproveita para alfinetar, em diversos momentos, religião e também o consumismo que se instaurou no mundo todo na segunda metade do século 20.
A obra de Adams foi tão importante que seu impacto foi para além da literatura. Alguns exemplos: O Guia do Mochileiro das Galáxias foi uma das maiores influências para a escrita da fase atual de Doctor Who; inspirou a música “Paranoid Android”, do Radiohead; e até mesmo serviu como base para o projeto do Pilot, um fone de ouvido Bluetooth desenvolvido pela Waverly Labs que promete traduzir conversas em diversas linguagens do mundo usando reconhecimento de discurso, uma tecnologia que é praticamente a versão “mundo real” do Peixe Babel, uma criatura alienígena concebida pelo escritor que tem a capacidade de reconhecer qualquer idioma de qualquer parte do Universo, traduzindo-os para seu hospedeiro.

Cinco curiosidades sobre Douglas Adams!

  • Ele foi a primeira pessoa a comprar um Macintosh no Reino Unido. Posteriormente, ele se tornaria um grande fã da Apple e de seus produtos, escrevendo diversos textos para revistas dedicadas a discutir as tecnologias da empresa;
  • Existe uma Travessa Douglas Adams, na cidade de São José, em Santa Catarina;
  • A premissa do livro A Vida, o Universo e Tudo Mais saiu de um roteiro que Adams escreveu para Doctor Who e que nunca foi produzido;
  • Adams escreveu e desenvolveu o conceito do jogo Starship Titanic, lançado para PC em 1998. No game, o jogador é um humano que teve sua casa destruída por uma grande nave – o objetivo é ajudar os tripulantes no reparo dos danos e embarcar ao lado deles em muitas aventuras;
  • Em 1999, Adams lançou o site O Guia do Mochileiro das Galáxias: Edição Terrestre. Nele, usuários de diversos lugares do mundo escreviam sobre suas culturas com diferentes perspectivas. O guia está no ar até hoje e pode ser considerado uma forma rudimentar da Wikipedia, que surgiu dois anos depois.
Apesar de não ter o mesmo reconhecimento acadêmico que outros escritores satíricos de sua época, como Charles Bukowski e Kurt Vonnegut, é inegável que Adams foi um dos mais populares e influentes autores do século 20. Sua obra foi fundamental na construção de uma cultura que era limitada a um nicho mas que, nos dias de hoje, rompeu barreiras e se tornou global. Adams provou que uma revolução pode se apresentar de qualquer maneira, inclusive na forma de uma piada.
Até logo e obrigado pelos peixes!

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