Catequese Digital – ou o amor nos tempos do YouTube
Era um domingo de sol preguiçoso, desses que a alma cochila depois do almoço. A vizinhança dormia, o ventilador rangia, e eu pecador comum abri o YouTube como quem abre o confessionário. Eis que surge, luminosa, uma mulher católica dando conselhos sentimentais a homens católicos.
Ela falava com a convicção de quem já salvou meia dúzia de corações e perdeu os outros na estatística. Dizia que “não é difícil conversar com uma mulher católica” e eu pensei: claro que não, difícil é saber se ela é católica mesmo ou apenas frequenta a missa como quem frequenta uma cafeteria com boa acústica.
A pregadora, entre um sorriso e outro, oferecia uma lista de virtudes: observar as pulseiras de consagração, estudar os hábitos da moça, saber o horário da missa. Quase um manual de caça espiritual, com mais tática que oração.
Mas e aqui Nelson Rodrigues ergueria o dedo teatral esquecia o detalhe mais trágico: há mulheres que falam demais e outras que já esqueceram o verbo “falar”.
Vivemos uma era onde até o silêncio é editado em vídeo. Os homens estudam “dicas católicas” como se estudassem fórmulas químicas. As mulheres, por sua vez, aprendem no TikTok a manipular corações com a naturalidade de quem faz trança no cabelo. E no meio desse circo, Deus é apenas um figurante de batina branca.
A moça do vídeo dizia ainda que “ser você mesmo” é um erro. E nisso ela tem razão ninguém suporta o verdadeiro eu de ninguém. A sinceridade virou escândalo. As pessoas se amam com filtros e se odeiam ao vivo.
Há homens que não se aproximam mais das mulheres por medo de parecerem “carentes”, e há mulheres que trocam de pretendente como quem troca de novena.
Cada um reza por um milagre, mas ninguém quer o sacrifício.
E o mais delicioso ou repugnante, conforme o humor é o papel das amigas e das mães.
Uma sente inveja, outra disfarça piedade, a terceira quer o mesmo homem “só para ver se ele é isso tudo mesmo”.
E todos, absolutamente todos, juram que o Espírito Santo aprovaria suas intenções.
O amor, no século XXI, virou um reality show onde ninguém quer ser eliminado, mas todos trapaceiam.
As mulheres, que dizem buscar cavaleiros de fé, preferem os canalhas com boa dicção.
Os homens, que dizem querer santas, fogem assim que elas abrem o catecismo.
E assim seguimos: catequizados pela internet, mas analfabetos do coração.
Epílogo – A Doutrina Social do Amor
Talvez a solução, se é que ainda resta uma, esteja naquela velha sabedoria da Doutrina Social da Igreja:
“O amor é compromisso, não performance.”
Enquanto tratarmos o outro como um teste emocional, e Deus como um algoritmo de encontros, o amor será sempre um sacramento profanado.
Mas se um dia voltarmos a olhar o outro com a ternura de quem quer construir e não apenas consumir, então, talvez, possamos desligar o YouTube e recomeçar de verdade.
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