Crônica: O Desespero de Quem Busca o Amor em Tempos Líquidos
Há algo de trágico e desesperado na busca moderna pelo amor. Vivemos em um mundo onde a solidão se tornou a regra e não a exceção, mas o que mais se vê por aí são sorrisos falsos e frases de autoajuda. "Eu me amo", "Eu me basto", dizem, como se o eco vazio dessas palavras preenchesse o abismo emocional em que nos afundamos. Ah, a mentira da autossuficiência... Ninguém se basta! Quem diz o contrário mente, mente para si, mente para os outros. Afinal, de que adianta repetir que se ama se, na calada da noite, o travesseiro é molhado de lágrimas?
Eu, que andei por essas estradas tortuosas, confesso que durante muito tempo não compreendi o que estava errado. Relacionamento após relacionamento, todos ruíram, e eu ficava à deriva, buscando explicações. Foi só na confissão, em uma conversa com o padre, que tudo começou a se clarear. "Você precisa se amar mais", ele disse. Ir ao cinema sozinho, me redescobrir. Mas será que a resposta está mesmo nessa solidão voluntária que me recomendam?
Vivemos em tempos líquidos, como bem alertou Bauman. Nada é feito para durar. As pessoas entram em relacionamentos como quem compra uma roupa nova: "Se não servir, a gente troca". A pressa é o motor do amor moderno, um amor apressado, descartável, sem raízes. E quem é que hoje, depois de quatro meses de namoro, já não está falando de casar? Tudo rápido demais, superficial demais. Só que o amor, meus caros, precisa de tempo, de maturação. Sem Deus, sem paciência, o que temos é um simulacro de afeto. Um amor de fachada, de aparências, que se dissolve no primeiro mal-entendido.
O filme 500 Dias com Ela captura bem essa tragédia do amor moderno. Tom, o protagonista, projeta em Summer todos os seus anseios, sonhos e desejos de uma relação perfeita. Só que o amor verdadeiro, aquele que dura, não se constrói em cima de projeções. O amor é real, é concreto, é feito de carne e osso, de dias bons e maus, de sorrisos e lágrimas. No entanto, o que vemos hoje é o oposto. Relacionamentos começando com declarações efusivas e terminando em silêncio. Tudo é feito para parecer eterno, mas na verdade está fadado ao fracasso, porque falta a substância, falta a profundidade.
Há também a solidão que escolhemos. Muitos de nós, talvez, cansados dos desastres amorosos, se isolam, se escondem atrás de livros, filmes, trabalho. "Vou me amar mais", dizem. Mas essa solidão, em vez de ser curativa, muitas vezes só aprofunda o abismo. Precisamos de Deus nessa equação. Sem Ele, essa busca por autoconhecimento e amor-próprio se torna uma ilusão. É como se estivéssemos correndo atrás de vento, tentando preencher um vazio que só a fé e a verdadeira intimidade com o outro podem preencher.
Dostoiévski, em Crime e Castigo, nos ensina que a ausência de Deus leva o homem ao desespero. Raskólnikov, perdido em suas justificativas morais para o assassinato, percebe tarde demais que sem Deus o amor é impossível, a redenção é impossível. E nós, hoje, não estamos tão diferentes. Em nossos relacionamentos falidos, na nossa incapacidade de suportar o outro, no egoísmo que corrói qualquer possibilidade de entrega genuína, vivemos o mesmo dilema. Nos enganamos achando que podemos amar sozinhos, que podemos ser completos em nós mesmos, mas a verdade é que sem Deus e sem o outro, somos vazios.
As redes sociais nos mostram um desfile de autossuficiência. Cada post, cada selfie é um grito de desespero: "Vejam como estou bem, vejam como sou feliz sozinho". Mas por trás das câmeras, o que resta? Um vazio, um abismo que ninguém tem coragem de encarar. E é nesse vazio que os relacionamentos vão naufragando, um após o outro, sem que ninguém se pergunte por que.
No fundo, todos queremos alguém para dividir a vida. Queremos amor, queremos afeto. Mas o que estamos dispostos a sacrificar por isso? Queremos o brilho, mas não a escuridão. Queremos o prazer, mas não a dor. Só que o amor verdadeiro é um pacote completo. Como diz o padre na missa: "Na alegria e na tristeza, na saúde e na doença". Sem isso, sem essa disposição de estar com o outro mesmo nos dias ruins, o que temos é apenas a solidão disfarçada de companhia.
E assim seguimos, fingindo que somos fortes, fingindo que nos bastamos, enquanto a sociedade líquida vai corroendo nossa capacidade de amar. Não queremos profundidade, porque profundidade requer esforço, requer Deus, requer compromisso. Queremos amores rápidos, intensos, fáceis. Mas o amor verdadeiro, o amor que transforma, só existe quando deixamos de lado o ego e abrimos espaço para o outro. Só existe quando, em meio à nossa solidão, permitimos que Deus preencha o vazio e nos ensine o que realmente significa amar.
Em tempos líquidos, amar é resistir à correnteza. É manter-se firme, com Deus ao nosso lado, mesmo quando tudo ao redor parece desmoronar.
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