Crônica: A Economia de um Filho

Imaginem, meus amigos, um casal moderno sentado no sofá, ladeado por tabelas, gráficos e uma calculadora. Como quem se prepara para comprar um carro ou decidir o destino das próximas férias, eles fazem contas. Muitas contas. Tudo minuciosamente calculado. Porque hoje, meus amigos, ter filhos virou um investimento, um projeto de retorno incerto, um cálculo de risco. Como um contrato firmado diante da frieza de uma planilha, eles se perguntam: vale a pena? 

O mundo mudou e, com ele, a ideia de família. Mas o que me espanta não é a mudança; é o medo econômico de um filho, como se ele fosse uma compra errada, um capricho que escorrega pelos dedos da conta bancária. Eles discutem os números como quem faz contas para uma viagem à lua: fraldas, escolas, brinquedos, médicos, tudo vem listado, desdobrado, analisado, centavo por centavo. E o futuro da humanidade, o coração pulsante da espécie, é desfeito diante da fria exatidão do Excel.

Nos velhos tempos, como sabemos, filhos vinham como quem respira. Eram parte do ar, da vida. Não havia cálculo algum, e muito menos um "será que vale a pena?". A criança era recebida com os braços abertos, era a continuidade da vida, a promessa do amor e do próprio futuro. Os pais confiavam que, com ou sem dinheiro, a vida daria um jeito. 

Mas o homem moderno — o homem dos gráficos e das tabelas — vive preso a essa matemática, escravo da própria segurança. O casal se pergunta o que o filho tiraria deles: quantas viagens, quantas idas a restaurantes, quantas noites de sono. Como se o amor fosse uma questão de quantas entradas e saídas restam na conta. No fim das contas, literalmente, o filho é rejeitado por ser um número negativo, um peso morto sobre os prazeres do presente.

E então o casal fecha a planilha, satisfeitos, e concluem que filhos são caros demais, que o mundo já está cheio de problemas, que a responsabilidade é grande demais. Eles respiram aliviados. Pouparam-se do investimento mais imprevisível da vida, de um amor que não dá lucro, de uma alegria que não se mede em tabelas. 

Mal sabem eles, talvez, que a vida não cabe nos números, que o amor de um filho é uma conta que não se calcula e que, às vezes, o maior ganho está naquilo que não se pode medir.

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